domingo, 20 de março de 2011

Uma história do copyright, por Rick Falkvinge - parte 6


Fonte: A Rede

Esta é a sexta parte da história do copyright escrita por Rick Falkvinge, fundador do primeiro Partido Pirata…

Abaixo, os links para as anteriores:



Parte 6: Sequestrado pela indústria fonográfica

O debate sobre copyright no século 20 foi caracterizado pela música e não pelos livros, ao contrário do que ocorreu nos séculos anteriores. Nos anos 1930, duas mudanças fundamentais afetaram os músicos: a Grande Depressão, que fez com que muitos músicos perdessem seus empregos, e o cinema falado, que fez com que outra grande parte dos músicos perdesse seus empregos.

Nessa conjuntura, duas outras iniciativas ocorreram em paralelo. Os sindicatos de músicos tentaram garantir renda e sustento às pessoas que estavam desempregadas ou "ficaram redundantes", como se diz hoje na linguagem corporativa. Sindicatos de todo o Ocidente estavam preocupados com a disseminação da "música mecânica": qualquer música que não era apresentada ao vivo e, portanto, não necessitava do trabalho dos músicos para apresentá-las. Os sindicatos queriam algum poder sobre a tecnologia de gravação, e o tema foi levantado por meio da Organização Internacional do Trabalho (OIT), uma precursora da agência da ONU que hoje tem este nome.

Ao mesmo tempo, a indústria fonográfica tentava se apropriar dos métodos de gravação e reprodução, do rádio e dos músicos. Mas o mundo político e corporativo, naquela época, considerava essa indústria apenas como um intermediário que contratava os serviços dos músicos. Se quisessem continuar administrando seus negócios, se tornando bons prestadores de serviços, ou então falir tentando, ninguém achava que valiam um tostão a mais do que qualquer outro. Ninguém, com uma exceção...

A Itália fascista
(Essa palavra, fascista, é carregada de emoção hoje. Naquele tempo, o regime italiano se autodeclarava fascista. Estou usando a palavra para descrevê-los exatamente como eles faziam.)

Em 1933, a indústria fonográfica foi convidada, pela Confederazione Generale Fascista dell’Industria Italiana, para participar de uma conferência em Roma. Neste evento, que ocorreu entre os dias 10 e 14 de novembro daquele ano, foi formada uma federação internacional da indústria fonográfica, que seria mais tarde conhecida pelo acrônimo IFPI. Foi decidido, na convenção, que a IFPI tentaria trabalhar dentro da Convenção de Berna para tentar estabelecer, para os produtores, direitos semelhantes aos dos artistas e músicos (que sempre foram vendidos a editores).

A IFPI continuou a se reunir em países que apoiavam sua agenda corporativista. O encontro seguinte foi na cidade italiana de Stresa. Mesmo no meio da turbulência que se abateu sobre o mundo depois de 1935, a Itália conseguiu promulgar os direitos
corporativos da indústria fonográfica em 1937.

Negociar um monopólio semelhante ao do copyright, que fosse incluído na Convenção de Berna e, portanto, tivesse validade internacional, era tentador demais para a indústria fonográfica. Assim, depois da guerra, a IFPI se reuniu em Portugal, um país para-fascista em 1959. A Itália não era mais apropriada. A conferência preparou uma minuta de texto que lhes daria um monopólio idêntico ao do copyright, chamado "direito conexo", para produzir e imprimir obras criativas como a música. Esse monopólio seria praticamente idêntico ao monopólio comercial do copyright para a fixação (a gravação) de obras criativas.

Os direitos conexos foram ratificados pela BIRPI (atual Organização Mundial da Propriedade Intelectual, OMPI) em 1961, na chamada Convenção de Roma, e deram à indústria fonográfica monopólios idênticos aos do copyright. Ao mesmo tempo, a tentativa da OIT de dar aos músicos monopólios similares nasceu, diminuiu, e fracassou.

A indústria fonográfica defende ardorosamente o copyright desde 1961, independente de não ter um monopólio de copyright, mas apenas um monopólio idêntico chamado "direito conexo".

É preciso lembrar de duas coisas, neste ponto:

Primeiro, a indústria fonográfica confunde de propósito os tipos de monopólio. Continua defendendo "seu copyright”, um tipo de copyright que não possui, e fala com nostalgia sobre como o monopólio do copyright foi criado, com grande sabedoria, na alvorada do Iluminismo, referindo-se ao Estatuto de Anne in 1709, que não foi o primeiro copyright. Na verdade, os monopólios de direitos conexos foram criados em países fascistas (literalmente!) em uma Europa cindida pelo militarismo, e somente em 1961. São monopólios controversos e questionados desde o dia de sua criação e com certeza não são o produto de nenhuma sabedoria iluminista.

Em segundo lugar, ficamos a um fiozinho de cabelo de considerar os selos das gravadoras como birôs de serviços para os músicos, se a OIT não tivesse fracassado, em vez do gargalo de músicos que eles se tornaram nas últimas décadas. Esse seria o caso se dois governos fascistas - no sentido literal da palavra - não tivessem dado seu apoio para a indústria fonográfica se tornar uma corporação e se tornar uma indústria do copyright.

Próximo: A monopólio do copyright é sequestrado -- de novo.

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