terça-feira, 26 de abril de 2011

Fausto - um mito do homem moderno...?

Mito transcontinental

Fonte: Agência FAPESP
Por Fábio de Castro

Eugène Delacroix, Méphistophélès apparaissant à Faust
Considerada um mito central da modernidade, a lenda de Fausto remete à tragédia de um homem de ciências desiludido com as limitações do conhecimento de sua época. A fim de superá-las, ele faz um pacto com o demônio Mefistófeles, que lhe insufla a paixão pela técnica e pelo progresso e lhe dá acesso ilimitado ao saber e aos prazeres do mundo.
Baseada na história do médico e alquimista alemão Johannes Georg Faust (1480-1540), a lenda foi imortalizada em diversas manifestações literárias a partir do século 16 – sendo a mais famosa e influente a obra de Johann Wolfgang von Goethe (1749-1832), no século 19.
As inúmeras interpretações do mito de Fausto e suas relações com a descoberta do Novo Mundo, sua conquista, colonização e desenvolvimento são o tema central do livro Fausto e a América Latina, publicado com apoio da FAPESP na modalidade Auxílio à Pesquisa – Publicação.
A obra, que reúne 30 ensaios de pesquisadores brasileiros e estrangeiros, foi organizada por Helmut Galle e Marcus Mazzari, respectivamente professores dos departamentos de Letras Modernas e de Teoria Literária e Literatura Comparada da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas (FFLCH) da Universidade de São Paulo (USP).
De acordo com Galle, o livro é resultado de um simpósio homônimo realizado em 2008 sob sua coordenação, com apoio da FAPESP na modalidade Auxílio à Pesquisa – Organização de Reunião Científica e/ou Tecnológica. Na ocasião, a publicação da primeira parte de Fausto, de Goethe, completava 200 anos.
“Na Alemanha, surgiram diversas interpretações recentes do mito de Fausto, que ainda eram pouco conhecidas no Brasil. Por outro lado, havia muitos pesquisadores latino-americanos trabalhando sobre a temática das relações entre Fausto e América Latina. Além de comemorar o bicentenário do livro de Goethe, o simpósio teve o objetivo de reunir e intercambiar toda essa pesquisa contemporânea”, disse Galle à Agência FAPESP.
O diálogo promovido no evento e refletido no livro teve um caráter essencialmente interdisciplinar, reunindo diferentes abordagens a partir da teoria literária, da literatura comparada, estudos germânicos, literaturas em língua portuguesa e espanhola, sociologia, história e filosofia.
“Os textos acabam indo além das interpretações do Fausto enquanto texto literário. Eles ampliam o debate para diversos outros aspectos do conhecimento sobre a cultura latino-americana, a modernidade europeia e suas múltiplas conexões”, afirmou Galle.
Um dos vários aspectos abordados é a figura de Fausto como símbolo do desenvolvimento da civilização. No século 19 e nas primeiras décadas do século 20, Fausto, como personagem criado por Goethe, foi considerado a encarnação do homem moderno, em seu desejo ilimitado – e nunca satisfeito – de desenvolvimento e conhecimento.
“Tudo isso foi simbolizado no Fausto como algo positivo. O próprio drama de Goethe foi considerado como símbolo do progresso e da civilização, tanto por positivistas no século 19, como por marxistas no século 20. Fausto aparecia, então, como o mito da modernidade, do homem que se libera e submete a natureza hostil”, disse.
Mas na Alemanha, principalmente a partir da década de 1960, outras interpretações do mito de Fausto começaram a aparecer. “Começa a aparecer a perspectiva da chamada ‘dialética do esclarecimento’, cujos elementos ambíguos colocavam em dúvida se o próprio Goethe considerava o progresso, simbolizado pelo Fausto, como algo positivo para o homem”, disse.
A época de Goethe, segundo Galle, testemunhou muitas inovações técnicas e o avanço da industrialização. O autor integrou essa realidade à segunda parte do Fausto, lançada em 1832. A primeira parte, conhecida como Primeiro Fausto, havia sido lançada em 1808, após três décadas de reflexão sobre o tema.
“Além da própria dinâmica da Europa como continente que se moderniza, temos também reflexos desse processo na colonização do Novo Mundo. Na perspectiva da dialética do esclarecimento, alguns autores identificaram versos do Fausto que parecem abordar a colonização, enquanto processo civilizatório, como uma iniciativa violenta, perniciosa, que gera mais destruição que benefícios para o ser humano”, disse.
Drama do conhecimento
O mito fáustico, no entanto, tem muitas outras interpretações e repercussões. “Encontramos reflexos de Fausto na literatura de cordel brasileira e na literatura popular argentina, por exemplo, além de manifestações literárias em outras partes do continente. No livro, temos vários ensaios sobre essas repercussões”, afirmou Galle.
O debate em torno da figura histórica de Fausto não ficou de fora da coletânea de ensaios. De acordo com o professor da USP, o personagem real, contemporâneo dos descobrimentos, aparece em sua primeira manifestação literária – o Faustbuch, no século 16, fazendo uma viagem pelo mundo, com a ajuda de Mefistófeles.
“Embora a obra tenha sido escrita mais de 80 anos depois da descoberta da América, a viagem de Fausto se limita à Europa, Ásia e África. Para alguns intérpretes, o autor do Faustbuch queria evidenciar, pedagogicamente, que só o conhecimento falso é produzido pelo diabo. Isso ficaria óbvio para os leitores, já que em uma viagem por todo o mundo a América deveria aparecer”, disse.
Poucos anos depois do Faustbuch, em 1593, aparece o livro conhecido como Wagnerbuch, no qual o assistente de Fausto, Wagner, faz uma viagem para a América. Galle é o autor de um ensaio sobre o Wagnerbuch.
“Esse livro se baseia em extratos de uma obra de viagem de Bensoni, um italiano que esteve na Venezuela, no Peru e na América Central e criticava duramente as ações da Espanha. A obra se tornou uma das fontes da chamada ‘legenda negra’, uma posição política do século 16 que contestava a ‘missão divina’ da conquista espanhola, qualificando-a como ‘obra do diabo’”, explicou.
Com diversas versões populares, segundo Galle, a lenda de Fausto se espalhou pela Europa e, em 1604, na Inglaterra, ganhou sua primeira manifestação culta de alto nível com a peça A trágica história de doutor Fausto, de Christopher Marlowe. “Até o século 18, o mito de Fausto teve ainda várias adaptações populares do teatro elisabetano inglês e novas versões alemãs em forma de livro”, disse.
Na segunda metade do século 18, no entanto, vários autores de renome percebem no material do Fausto o paradigma do ser humano moderno, segundo o professor, com destaque para Gotthold Lessing (1729-1781).
“A partir de então, Fausto se torna também o drama do conhecimento. É nesse contexto que aparece a primeira parte do Fausto de Goethe, publicada em 1808. Muito antes disso ele já trabalhava no texto, cuja segunda parte continuou aprimorando até 1832”, disse.
Depois da profundidade atingida por Goethe, poucos poetas se aventuraram a lidar com o mito de Fausto. Mas, segundo Galle, a ópera passou a tratar o tema de forma recorrente. A partir do início do século 20, diversos modernistas retomaram o personagem, incluindo Fernando Pessoa (1888-1935), Paul Valéry (1871-1945), Gertrud Stein (1874-1946) e Thomas Mann (1875-1955).

segunda-feira, 25 de abril de 2011

mote: um resumo de trabalho de Liu e Fahmy

Exploring the spiral of silence in the virtual world: lndividuals' willingness to express personal opinions in online versus offline settings

Xudong Liu1 and Shahira Fahmy2*
1School of Journalism, College of Mass Communication and Media Arts, Southern Illinois University, Carbondale, IL, 62901, United States.
2School of Journalism, Department of Near Eastern Studies, College of Social and Behavioral Sciences, the University of Arizona, 845 N. Park Avenue, Marshall Building 325, P.O. Box 210158B, Tucson, AZ 85721-0158, United States.
*Corresponding author. E-mail: sfahmy@E-mail.arizona.edu.
Accepted 30 December, 2010
 
Abstract
This study extends the understanding of the spiral of silence theory by taking into account the impact of new media on virtual behavior motivation. It explores individuals' willingness to express opinions online and offline and tests how the constructs proposed by the spiral of silence theory work in each setting. Results of a survey (N=503) suggests that when the likelihood of speaking out online increases, the likelihood of speaking out in a real setting also increases, and vice versa. Findings further suggest that the congruency of current opinions with one's own opinions predicts the willingness to speak out offline. Congruency of future opinions, however, failed to predict the likelihood of speaking out offline. Findings also indicated that congruency of future and current opinions did not predict the willingness to speak out in the online setting. Furthermore, while experiencing fear of isolation predicted by the willingness to speak out online, it did not affect offline outspokenness.
Key words: Spiral of silence, opinion-climate online, online environment.

sábado, 23 de abril de 2011

Um economista falando de economistas e de economia... das novas redes se tecendo...

A propósito do que vimos discutindo... Apocalipse?! Há saídas?! O que cada um de nós pode fazer?! Não há o que fazer...?!

Economia| 22/04/2011 | Copyleft

Há vida inteligente no horizonte teórico dos economistas?

O mundo avança gradualmente no que tem sido caracterizado como catástrofe em câmara lenta, e os ajustes necessários no coração mesmo das formas de administrarmos a economia ainda estão engatinhando. Assustados com a acumulação e superposição de tendências críticas, os povos buscam de certa maneira voltar ao limbo do que funcionou no século passado, e temem naturalmente os transtornos. Gera-se um tipo de inércia institucional cada vez mais perigosa. Inovar é preciso. A boa notícia é que está se gerando uma rede planetária de economistas de bom senso que começam resgatam uma visão da economia a serviço da sociedade, e não de como se servir melhor. O artigo é de Ladislau Dowbor.


Ladislau Dowbor

O lamentável mainstream econômico ainda acha que o preço das commodities pode ser deixado na mão de um grupo de especuladores internacionais, que o futuro do petróleo ser resolverá por si mesmo, que a mudança climática é uma perspectiva desagradável trazida por cientistas ávidos de manchetes, que déficits gerados por especuladores financeiros (praticamente 100% do PIB só nos Estados Unidos) devem ser pagos pelos pobres, que a crescente desigualdade mundial se resolverá pela mão invisível. Quem são os sonhadores?

O mundo avança gradualmente no que tem sido caracterizado como catástrofe em câmara lenta (slow motion catastrophe), e os ajustes necessários no coração mesmo das formas de administrarmos a economia ainda estão engatinhando. Assustados com a acumulação e superposição de tendências críticas, os povos buscam de certa maneira voltar ao limbo do que funcionou no século passado, e temem naturalmente os transtornos. Gera-se um tipo de inércia institucional cada vez mais perigosa. Inovar é preciso.

Em Paris, neste mês de abril de 2011, reuniram-se economistas de diversos continentes para discutir os desenhos de uma “alternativa econômica global”. A iniciativa é do CCFD, uma ONG tradicional que luta pelos avanços sociais no planeta. Foram tres dias de apresentação de angústias e propostas por parte de economistas que têm consciência da dimensão dos desafios, e da própria fragilidade das propostas inovadoras, frente aos interesses dominantes que se agarram às velhas práticas e aos privilégios.

Não é uma reunião para soluções, tipo de um novo catecismo com regrinhas. Os desafios são demasiado complexos. Mas há sim eixos teóricos que se desenham.

Julia Wartenberg trouxe um pouco do clima que prevalece nos Estados Unidos, onde uma onda de pessimismo está varrendo do mapa a tão sólida crença no progresso indefinido, de que cada nova geração estará melhor do que a dos pais, de que as crises são coisas de países pobres, de que uma pessoa que queira trabalhar duro subirá na vida, de que se deixarmos o mercado em paz as coisas irão se resolver. Com uma dívida que equivale a um quarto do PIB mundial, e 40% dos lucros corporativos provenientes não da produção mas da especulação financeira, realmente já é tempo que os economistas americanos comecem a pensar em vez de repetir dogmas do século passado. Desorientados, os americanos se perguntam porque as coisas não estão funcionando, e buscam soluções menos ideológicas, e mais funcionais.

Os economistas franceses estão se mexendo, como Geneviève Azam, Xavier Ricard, Christian Arnsperger e Gael Giraud. Os países ricos foram adiando problemas ao substituir a demanda baseada em rendimentos reais por demanda baseada em crédito ao consumidor: as populações passaram a consumir não a partir da renda já recebida, mas em função do crédito obtido – via cartões e outros – gerando assim imensos lucros financeiros, mas uma demanda que vai se estrangulando pelo acúmulo de dívidas. “Porque a vida é agora”, por assim dizer. O resultado é um nível de consumo artificial cuja conta hoje aparece. Com a direita no poder, não são os intermediários financeiros os que são chamados a pagar, mas os que dependem de políticas sociais. Em nome da austeridade, reduz-se a demanda popular, aprofundando a crise.

A partir de economistas latinoamericanos, e em particular de representantes indígenas, surge com força a idéia do “bien vivir”, que implica reduzir a corrida extrativista e a obsessão consumista, e buscar equilíbrios nos valores, nos objetivos reais representados pela qualidade de vida para as pessoas associada ao respeito pela mãe natureza. Não é poesia, é bom senso. Idiotice é pensar que podemos continuar a espoliar o planeta impunemente, e equilibrar a economia ao concentrar os recursos nas mãos de minorias.

Teopista Akoyi, de Uganda, trouxe os imensos desafios da agricultura familiar, que ainda ocupa a metade da população mundial. Na linha do excelente relatório IAASTD com o qual contribuiu, analisa o mundo rural não apenas como fonte de produção e exportações, mas como dinâmica que tem de ser culturalmente aceitável pelas populações. A agricultura científica pode perfeitamente acomodar-se da agricultura familiar, dinamizando sistemas tradicionais, em vez de expulsar as populações com a monocultura extensiva que gera esgotamento de solos no campo, contaminação química da água e favelas nas cidades.

Enfrentamos, sem dúvida, elites predatórias, e em grande parte nos sentimos impotentes. Arnsperger traz com força a visão da necessidade de se democratizar os procedimentos econômicos, tanto pelo reforço da transparência, como por processos que permitam supervisão, em particular no mundo financeiro que afinal trabalha com dinheiro de terceiros, mas também em uma série de áreas críticas. Na realidade, não há porque a democracia parar nas portas das corporações. Toda atividade que tem impacto social deve prestar contas à sociedade, não é nenhum abuso. Quem tem mãos limpas pode mostrá-las.

As visões que surgiram na reunião podem provavelmente encontrar neste conceito de democracia econômica o seu denominador comum. A economia dever estar a serviço da sociedade. É tempo de repensarmos os seus paradigmas não com as bobagens de que se trata de uma “ciência”, e sim com bom senso. O que vivemos hoje é uma crise de visão do mundo. Até quando aceitaremos a morte de dez milhões de crianças por ano quando temos os meios financeiros e organizacionais para resolver o problema?

Alberto Arroyo nos fala do socialismo comunitário, democrático e descentralizado, em vez do socialismo burocrático. Kavaljit Sing, da India, apresenta o seu Fixing Global Finance, Oscar Ugarteche a necessidade de buscarmos formas práticas de expandir a compreensão do novo “senso comum”, em particular com a generalização do acesso ao conhecimento. São numerosas propostas, e pouco poder. Mas a rede que vai se formando no planeta tende a gerar novas convergências.

A realidade é que através de inúmeras iniciativas, que vão desde as reuniões do Fórum Social Mundial, até a rede Otro Desarrollo na América Latina, a New Economics Foundation de Londres, Ethical Marketplace de New York, Alternatives Economiques da França, blogs como o nosso Crise e Oportunidade , o movimento Real Economics, o Madhyam na Índia, enfim, está se gerando uma rede planetária de economistas de bom senso que começam resgatam uma visão da economia a serviço da sociedade, e não de como se servir melhor.

sábado, 9 de abril de 2011

Antropologia Cyborg

Esse é um exemplo bem ilustrativo de uma ciência pós-moderna, não?
As novas tecnologias são, necessariamente, nossas extensões mentais? Somos nós uma organela do todo tecno-humano?
Bom, embora eu ainda tenha certas dúvidas sobre a maravilha das possibilidades de comunicação atual e sobre sermos ou não cyborgs, acho que vale a pena pensar no conceito dessa tal antropologia cyborg...


quinta-feira, 7 de abril de 2011

Sobre marketing, auto-imagem, divulgação de imagem...


Atum Tenório


Atum Tenório hoje
O atum “TENÓRIO” é dos poucos que ainda não foram à televisão apresentar as suas reivindicações. Trata-se de um atum bastante antiquado, muito pouco dado aos aliciantes dos “mass media”. O rosto de Francisco Rodriguez Tenório que fita do centro da lata, realçado severamente por suas suíças longas e sobrolho carregado, é ele próprio uma garantia implacável de tradição e de honestidade.
Não alinha nas campanhas publicitárias com que os atuns menores se procuram agraciar junto aos espectadores. O “Tenório” é o Alexandre Herculano dos atuns enlatados – sóbrio, fidedigno, objectivo e bom. A efígie de Dom Luís, Rei de Portugal, protector da Exposição na Real Tapada em 1804, fala-nos de um tempo passado, em que um atum ainda era um atum, um Rei ainda era um Rei, e os mares ainda eram nossos.
Em parte alguma da embalagem se lêem adjectivos gratuitos. Não diz “delicioso” nem “econômico”. Não diz nada. Nem sequer diz “de fácil abertura” – até porque a abertura é saudavelmente dificílima. O atum “Tenório” não é atum para facilitar a vida do utente – não tem embalagem de celofane com chave lá dentro. Nem uma coisa nem outra – só a lata e o atum. Presume, com justificada arrogância, que a qualidade do peixe obriga o consumidor a responsabilizar-se por encontrar uma chave, um maçarico, o que seja. O bom atum Francisco Rodriguez Tenório não está decididamente para brincadeiras.
Cada lata custa aproximadamente 150$00, o que não é barato nem caro, mas inteiramente justo.

Fonte: Miguel Esteves Cardoso, A causa das coisas, 7 ed. Lisboa: Assírio & Alvim, 1988, p. 308.